quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Dias difíceis



É preciso coragem para viver neste país, um cantinho da África onde excepto a coragem e a boa vontade da sua gente, falta tudo. O guineense é corajoso, cheio de boa vontade; tem um coração grande o que faz dele um caso à parte no continente africano onde proliferam conflitos; onde em muitas zonas ainda se vive como na pré-história e a doença e a morte são tão naturais como o ar que se respira.

Depois do colonialismo bárbaro com todas as suas especificidades, que deixou os dominados em condições de triste memória, podem ser contados pelos dedos das mãos aqueles que conseguiram escapar desses tentáculos, organizar-se minimamente, ensaiar os passos em direcção ao progresso e desenvolvimento. 

No caso da Guiné-Bissau, pode-se dizer, sem incorrer em exageros, que tudo vai mal. Depois da luta que se gaba de ter sido “brilhante”, “heróica”, “exemplar”, a independência que sucedeu, até aqui não se reflectiu grandemente na vida dos guineenses. Falta tudo, e, para agravar, nem a tranquilidade pode ser garantida aos que, por uma ou outra circunstância feliz ludibriaram a morte. 

Os que lutaram pela independência hoje são meras lembranças de gente que, por acreditarem num futuro promissor, um dia de descanso empenharam as suas vidas pela causa da libertação da Guiné do jugo colonial fascista. Hoje em dia, vão desaparecendo um a um sem a satisfação do sonho realizado tirando, quiçá, a participação na conquista da independência nacional. Mas, quarenta anos depois, a independência marca passo. 

Nada avança por obra e graça daqueles que eram supostamente os melhores filhos desta terra. Se os melhores são nivelados pelos padrões que catapultou os que têm dirigido o país até aqui, então, como será com os que não se enquadram nesses parâmetros?

Por mais triste que seja, há que reconhecer que o novo mundo é orientado por novas formas enquadradas por novas fórmulas de colonização. O país não sai do círculo vicioso porque não consegue sacudir, organizar, gerir as coisas em função da sua realidade, sem passar pelo uso de receitas produzidas em laboratórios sofisticados, longe do nosso meio, sem ter em conta se de facto o que propõem servem na perfeição ou não, não tão pouco se é esse o querer do povo. 

Resultado: A sociedade está dividida em espertos, tolos e miseráveis, com os primeiros a não se entenderem e por via disso estarem em permanentes conflitos de interesses que têm gerado crises e mais crises para nossa tristeza e desventura.

Dentro dessa redoma, construída por instituições financeiras com máquinas de pressão bem lubrificadas, lá vamos nós cantando e rindo e sonhando com nova vida, um futuro melhor, sob a batuta de maestros canhestros cuja projecção do futuro começa no estômago e termina no umbigo. Para completar o cenário trajam smokings brilhantes e ostentam a célebre faixa REPRESENTANTE DO POVO. 

EDITORIAL Gazeta de Notícias edição de terça-feira dia 06/09/2016

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