Não sou do PAIGC,
alias, não sou de nenhum partido político mas tenho uma grande admiração e
respeito pelos Combatentes da Liberdade da Pátria, todos eles, sem excepção,
seja os que lutaram nas frentes dos combates de arma nas mãos, seja aqueles que
andavam pela Zona Zero na mobilização, seja aqueles que calcorreavam o mundo na
chamada Frente Diplomática a pedinchar apoios, seja aqueles que assistiam os
guerrilheiros ou mesmo aqueles que simplesmente serviam o partido no
secretariado em Conacri. Todos me merecem um profundo respeito, isto sem nunca
ter sido sequer pioneiro do Partido de Amílcar Cabral. É o respeito puro, acreditem!
Tive o privilégio de
visitar o celebre ‘bureau’ do histórico PAIGC na Guiné-Conacri onde funcionou o
mítico secretariado do partido de Cabral, de resto, o local que servirá de
cenário de morte do lendário engenheiro revolucionário.
Um dia ao falar com o
não menos Combatente de Primeira Hora, general José Sanhá, sobre a gesta
libertadora e os seus principais atores, pude saber que entre as pessoas que
labutavam no ‘bureau’ do PAIGC em Conacri ao lado de Amílcar Cabral
encontrava-se a Isabel Buscardini.
Rápido, procurei a
tia Isabel para saber o que andou ela a fazer no ‘bureau’, qual foi o seu
verdadeiro papel, como conheceu o engenheiro-chefe-de-guerra, como era o
ambiente entre os camaradas, coisas assim. Pura curiosidade de um jovem que
quer saber cada vez mais das peripécias da gesta libertadora. Naquela sua forma
calma e mansa de falar - qual mulher de um celebérrimo chefe da polícia da
Guiné de antanho - a tia Isabel nunca se furtou de me contar as passadas da
luta, as curiosidades que se passaram no secretariado em Conacri. Mas, quase
sempre interrompia a nossa conversa com um: Nha fidju no dixa pa utru dia. Era
sempre quando a conversa ia no ponto.
Um dia das nossas
muitas conversas – que até cheguei a pedir para passar a gravar mas ao que ela
pediu que fosse mais tarde- lá me adiantou que estava a pensar seriamente em
escrever a sua memória de luta. Contar a sua versão dos factos. Fiquei
entusiasmado com a ideia. Pois com os relatos que ela poderia fazer íamos, de
certeza, conhecer em pormenores, factos e casos partir de alguém que privou e
de perto, durante largos anos, com o Militante Numero Um do velho PAIGC. É que
muita boa gente só ouviu falar de Cabral, Isabel Buscardini é daquelas pessoas
que conheceu, trabalhou, privou, com o Comandante-em-chefe do PAIGC. É uma
autoridade se fosse falar de Cabral e da epopeia libertadora.
Sempre que a
encontrava atirava-lhe com esta pergunta: Tia Isabel nta livro?
A resposta era quase
sempre esta: Nha fidju na purpará. Tempo kun nka tene inda, ma i na bim!
Ela tratava-me por
nha fidju ao saber que sou de Mansoa, terra em que ela fora criada e da qual
passou a ser deputada na legislatura ainda em curso. Quando ainda estava na
direcção do Clube de Futebol “Os Balantas” de Mansoa sempre que havia uma
reunião em Mansoa fazia questão de, pessoalmente, convidar a tia Isabel Buscardini
para tomar parte. Lá aparecia. Várias vezes deu o seu apoio às iniciativas do
Clube.
Foi dessas andanças
- contou-me alguém da entourage dela - que teria enxotado uma determinada
personagem que teria tentado junto dela falar mal de mim. A resposta da tia
Isabel perante o dito cujo teria sido esta: Nkata ceta pa papia mal de nha
djintis na sé trás. Conta-se que o ambiente ficou tão pesado que o intrujo lá
teve que fugir com o rabo entre as pernas.
A tia Isabel partiu
sem escrever o livro. É pena. Uma grande biblioteca do nosso país que se
esfumou. Penso que todos nós, sobretudo, os sedentos de uma história de verdade
contada pelos principais intervenientes na luta de Libertação Nacional ficamos
com pena que assim tenha sido.
Termino como
comecei. Não sou do PAIGC, aliás, não sou de nenhum partido, mas sou guineense
e sendo isso posso emitir esta homenagem a qual associo uma exortação no
sentido de este momento servir de recolhimento e de concórdia entre os
Camaradas.
Em gesto de
magnanimidade penso que o histórico partido poderia organizar uma singela
homenagem à tia Isabel quanto mais não seja com base no estatuto de Combatente
de Liberdade da Pátria que ela conquistou com brio e honra, isto
independentemente de pertencer aos 15 ou aos cinco Camaradas que teriam estado
na fundação do PAIGC nos idos de 1956!
É apenas a minha
opinião,
Mantenhas de tchur.
Por: Mussá Baldé
Nota
do Editor
Sem
palavras perante enorme relato do extraordinário jornalista Mussá Baldé!
Estamos
perante uma perda “gigantesca” como disse uma familiar!
Descansa
em PAZ tia Isabel Buscardini
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