Ernesto Dabo |
Dá muito jeito falar de reconciliação na Guiné-Bissau, porque no mercado
politico nacional é produto que se procura desesperadamente, a ponto de, na
maioria dos casos, comprarmos gato por lebre sem nos importarmos com o bichano
que compramos. Precisamos dela como de água no deserto.
Essa dramática necessidade, paradoxalmente tem sido aproveitada mais para
se ocupar centros de decisão e daí implementar processos de exclusão. Nas
campanhas eleitorais ou outras, todos juram a pés juntos serem pela reconciliação,
unidade, paz, desenvolvimento, contra a divisão, tribalismo, etc, etc. .
Mal atingem o poleiro, na maioria dos casos, inexplicavelmente,
transformam-se nos mais corrosivos adversários dos seus próprios interesses e
deveres essenciais, que são a defesa da legalidade, equidade e sensatez no
exercício das suas funções, de jeito a impedirem caminho a factores
promocionais de conflitos geradores de mais ódio, divisão e
subdesenvolvimento.
Este comportamento merece um estudo muito sério, porque é irracional e
prejudica em primeiro lugar os responsáveis por ele, quando são políticos com a
missão de governar o país. A meu ver, dirigir, seja a que escala for, implica
que se seja capaz de, em circunstância alguma, se esquecer que se está a agir
em nome e para defesa dos interesses das pessoas. Para que isso suceda com
qualidade e satisfação da maioria, deve-se selecionar o staf, tendo por
critério principal a competência, capacidade e disponibilidade de e para o
trabalho. Nunca excluir por clientelismo ou outros “ismos” do estilo, porque
isso é contrário à qualidade, factor sem o qual, boa governação não se consegue
instalar. A título de exemplo, notemos que sempre que a cólera assola o país,
ninguém se descuida com a qualidade da água e outros alimentos que consome,
porque disso pode depender o fim do fulano ou fulana. Isso é um ensinamento
particularmente recomendável para quem está a governar. O inverso sempre levou
à desgraça, porque as sociedades também sobrevivem graças à qualidade do que
consomem, nomeadamente, do cardápio politico-governamental.
Ao nos darmos conta de que as exonerações e nomeações que temos vindo a
conhecer nos últimos tempos, numa elevada percentagem de casos, são trocas algo
bizarras, se balançarmos, em termos relativos, as competências envolvidas. Em
muitos casos, a mediocridade substituiu a competência e experiência. E o que
mais me surpreende e entristece, acreditem ou não, é o facto de que a
composição da presente equipa no poder é um paradigma desejável para qualquer
sociedade desde que constituído segundo outros critérios.
Se tivermos em conta a procedência e a história das relações políticas
dos integrantes, nomeadamente do elenco governamental, diríamos que estamos
face a um caso suis generis de reconciliação e integração, pois que semelhante
amálgama ninguém acreditava que extravasasse o domínio do virtual. Mas porque o
guineense ganha todos os “mundiais” da originalidade pela negativa, esta equipa
entendeu fazer da exclusão um objectivo estratégico, alegadamente porque vale mais
trabalhar com um incompetente da sua confiança do que com quem pensa e seja
capaz de fazer, para estarem seguros nos respectivos postos. Esta incongruência
é simplesmente horrível, na medida em que está a suceder numa época em que o
nosso país é o maior depositário de provas provadas de que a exclusão é a “mãe
“ de todas as degraças. Lamentavelmente insistimos em desgraçar o país, por
continuarmos a privilegiar a aberração de proceder “ao preenchimento da escala
hierárquica administrativa com quadros partidários ou “clientes”, em detrimento
das competências e qualificações exigidas pelas funções. Não espanta por isso
ver-se à frente de cargos profissionalmente exigentes, indivíduos pouco
capacitados que, em função da sua lealdade pessoal para com o seu chefe
(patrono), são convidados a ocupar esses cargos para os quais estão motivados,
mas para que nunca foram tecnicamente preparados” 1.
Nós somos um povo pobre num país rico, porque temos muito pouco capital
humano (intelectual) para investir no desenvolvimento e fazemos da exclusão um
instrumento de combate às diferenças de pensamento e postura na classe
politica, nomeadamente. Pena: quem exclui não conclui.
Em jeito de fecho, é com acentuada vénia que cito um pensamento expresso
pelo saudoso Comissário Principal, Francisco Mendes (Chico Té): “Não é preciso
que toda a gente seja do partido. O que é preciso, é que toda a gente seja
patriota”.
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1. Álvaro Nóbrega,
“ A LUTA PELO PODER NA GUINÉ-BISSAU”, pag: 182
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