Nascido
em uma família balanta humilde da província norte da República da Guiné-Bissau,
Joãozinho (Djonsinho) Saba M’bunde, desde muito cedo, revelou incomodo com a
presença colonial portuguesa na sua terra e o consequente sistema opressor da
época. Como prova de sua rebeldia, Djonsinho Saba M’bunde, com apenas 14 anos,
aderiu às fileiras militares do Partido Africano da Independência da Guiné e
Cabo Verde, apesar de forte resistência dos seus pais, que tentaram, sem
sucesso, impedi-lo, sob o argumento de que era muito jovem. O jovem M’bunde
participou corajosamente de várias batalhas e, pela proteção divina, o pior que
lhe aconteceu foi ter levado tiro numa das pernas, deixando-o com uma indelével
cicatriz.
Por ter revelado elevada
inteligência, M’bunde integrou o grupo de jovens que o comandante Amílcar
Cabral sugeriu, aquando de uma de suas visitas regulares às barracas do
partido, que fosse enviado para formação acadêmica na União Soviética. Quis o
destino, isso não aconteceu e tempos depois M’bunde, ainda jovem, seria
instruído e aproveitado para ser professor nas zonas libertadas - o meu pai
apresentava-me a figuras de administração pública da Guiné-Bissau que foram
alunos seus nas matas da Guiné e que respeitosamente o chamavam professor -
após a independência, Saba M’bunde continuava a dar aulas pelo interior do
país, em várias cidades, desde São Domingos a Olossato, ensinando e ajudando a
organizar escolas de ensino básico.
No começo da década de 1990, já
com a abertura política decretada, professor Djonsinho deslocou-se
definitivamente para capital Bissau com sua família. “N’tissi bós pa Bissau pa
pudi da bós skola”, sempre dizia. Ele queria o melhor que não teve para os seus
filhos e para o país para qual lutou e deu o próprio sangue. A sua convicção
nacionalista e patriótico o fez sonhar sempre por uma Guiné melhor, para o qual
deu suor, doando sua adolescência e sua juventude ao serviço de um país
independente e desenvolvido.
Com as decepções de regime único
acumuladas, Saba M’bunde, outrora um Paigcista nato, integrou o Partido de
Renovação Social que acabara de ser fundado em 1992, resolvendo fazer política
ativa. Arduamente trabalhou para a ampliação da base do PRS, mobilizando jovens
e mulheres para às fileiras desse partido. “Es i nha primeiro fidju matchu,
presidente”, lembro-me que com estas palavras o meu pai apresentava-me, em 1993
(eu tinha 9 anos), pessoalmente a Koumba Yalá, ex-Presidente da Guiné-Bissau e
fundador do PRS, na antiga sede deste partido, no bairro de Missirá, tendo este
respondido: “ami kubu pape nona tarbadja pa muda es terra, pa da bós
oportunidade”. Em 1999, M’bunde seria eleito deputado da nação, compondo assim
o grupo dos mandatários de segunda legislatura pós-democratização, e nomeado,
logo depois, administrador de setor de Bigene.
Nos últimos anos de sua vida,
morando entre Bissau e Bigene, a sua vida foi marcada pelo cultivo e plantação,
revivendo a atividade que aprendeu com seus pais camponeses e que também
acompanhou a sua trajetória enquanto professor no período pós-independência.
A nossa penúltima conversa, via
telefone, foi sobre a situação política da Guiné-Bissau, nosso habitual
bate-papo. Era uma conversa entre um pai que tinha acumulado o conhecimento
político decorrente de própria experiência política da Guiné-Bissau, e um filho
que tinha algum conhecimento teórico acumulado e que ouvia atentamente a
leitura política de um pai que sempre admirou e serviu de inspiração.
Já acamado em tratamento e muito
doente, a nossa última conversa, pelo aplicativo de facebook e video, foi sobre
o cristianismo e Jesus Cristo. Disse-lhe: “pai, por que não voltas a Jesus?
todos nós tu levaste ao cristianismo e depois abandonaste!”, tendo ele
respondido prontamente: “não tenho problemas em fazer isso”. Alguns dias
depois, ele próprio chamou o pastor, oraram e Saba M’bunde começava a cantar
hinos da igreja e aos mesmos cânticos o seu corpo foi sepultado aos 66 anos,
morto vítima de doença prolongada.
Até um dia, pai, amigo e
professor Joãozinho Saba M’bunde!
Determinação, amabilidade e personalidade são alguns dos valores que nos
deixaste.
Eu, em nome da nossa mãe, dos meus irmãos e dos demais familiares, agradeço pelas ligações, mensagens e visitas de solidariedade que temos recebido durante esses dias. Obrigado!
Eu, em nome da nossa mãe, dos meus irmãos e dos demais familiares, agradeço pelas ligações, mensagens e visitas de solidariedade que temos recebido durante esses dias. Obrigado!
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