Há cinco anos atrás dediquei
ao meu pai algumas palavras por altura do seu octogésimo segundo aniversário,
infelizmente mantêm-se actuais e, fora eu a escrever o seu epitáfio, a elas
voltaria.
As armas e os barões. Assim se
inicia o poema épico de Luís Vaz de Camões, curiosamente parece ser assim que
termina a República da Guiné-Bissau... sendo as armas e os barões outros que
não os Camonianos...
De proto-Estado respeitado a estado em estado-de-sitio bastaram 37 anos de desmandos e fartar vilanagem por parte de alguns para desgraça de todos os outros.
De uma luta de libertação
nacional exemplar que a todos inspirou respeito e consideração a uma plêiade de
golpes-de-estado-tiro-no-pé que inexoravelmente nos garantiram lugar cativo
entre os "damnés de la terre".
De um estado nação a um estado de nações, perdidos os valores de antanho que nos mantinham unidos e focados nos objectivos de uma pátria, uma só nação, um futuro melhor... as crianças são as flores da revolução, etc. e tal... hoje rouba-se o futuro às crianças e à nação em prol de interesses escusos, mesquinhos e egocêntricos.
Lembra-me o "poema
negro": "não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou
por aí!". Infelizmente o caminho rejeitado é o do progresso, da
prosperidade, do respeito pelo outro, da cidadania, do urbanismo e do civismo.
Depois há os outros, como eu, que de fora nos vamos insurgindo, treinadores de bancada/sofá, mas que podemos julgar com base nos slow motions dos replays televisivos e como críticos da obra feita temos sempre razão... ou razões...ainda que contraditórias, de acordo com a "cor" dos "óculos" que usamos... no interim os locais continuam sobrevivendo, lutando, aguentando estoicamente a estroinice de alguns que têm o poder de poder fazer pois detêm as armas e não hesitam em usá-las e de outros que, livres da pressão de ter de viver sob pressão, vão dando "bitaites" mais ou menos educados sobre como devia ser o que não é.
Hoje o meu pai perfaz 82 anos,
lutou pela independência do seu país, como muitos outros da sua geração, sofreu
as agruras da prisão política, idealizou com Amílcar Cabral, Aristides Pereira,
Fernando Fortes, Luís Cabral e Júlio Almeida, naquela casa no bairro da Tchada,
em Bissau, a 19 de Setembro de 1956, uma Guiné onde coubéssemos todos em
harmonia.
Viu o desaparecimento físico
de uma boa parte dos seus "camaradas"; viu o desmoronar do sonho de
uma Guiné independente e próspera; assiste aos eventos bélicos da actualidade
que cortam o desenvolvimento sustentável do país; assiste ao descalabro social
e moral do país.
Assiste ao desmoronar da
utopia que o levou a insurgir-se contra o poder colonial. Hoje, não deve estar
orgulhoso com o rumo que a Guiné-Bissau independente leva. Mas de certeza que
não perdeu a esperança de assistir ao surgimento de uma Guiné melhor, tal como
a idealizaram nos idos de 1956... sem armas nem barões...
Nota
do Editor
Está marcada para amanhã
sexta-feira às 10 horas da manhã, a cerimónia fúnebre para a última morada do
COMBATENTE DA LIBERDADE Elisée Turpin.
O Secretariado Nacional do PAIGC
(sede), vai ser o local onde serão feitas as últimas honras ao último
testemunho vivo da fundação do partido que conquistou a INDEPENDÊNCIA da Guiné.
Convida-se assim a todos os guineenses a participarem na cerimónia.
Nô bai!
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