terça-feira, 15 de março de 2016

Um Voo Memorável (Inspirado num post de Carlos Uissa)

 
Eu estava sentado na primeira fila do Boeing 767. Domingos Simões Pereira e esposa estavam sentados na mesma fila ao meu lado esquerdo, junto à janela do avião. Ao meu lado direito estava sentado Mário Lopes da Rosa. 

O aparelho saiu devagar do estacionamento, no aeroporto da Portela, rolou até ao fim do longo pavimento, depois virou à direita, aproximando-se da pista de descolagem. Quando já se preparava para aceder à pista, o Comandante apresentou-se: 
 
– Bom dia. Fala-vos o Comandante Mário Tavares.

O Domingos e eu entreolhamo-nos e, quase em uníssono, gritámos:

– Uau, Mário João!

Ambos sabíamos que o Mário João é comandante de voo da Euro Atlantic. O que ambos não sabíamos é que ele é que estava a pilotar o avião naquele dia.

Estávamos a 27 de Março de 2015. Tínhamos deixado Bruxelas na véspera, depois da mesa redonda, e passámos a noite em Lisboa. Na manhã seguinte apanhámos o voo da Euro Atlantic para regressar a Bissau. Estávamos ainda excitados com o que acontecera em Bruxelas. Mário João aumentou ainda mais a nossa excitação ao dar os detalhes do voo em Português, depois em Inglês e em Crioulo. A seguir, sempre em Crioulo, saudou o Primeiro-Ministro e sua comitiva e felicitou-nos pelo sucesso da mesa redonda. 

O avião acelerou na pista e, instantes depois, a roda de frente já estava no ar, propulsando o aparelho para cima. O céu de Lisboa estava azul e limpo e, pelas janelas, podia-se ver a cidade ainda calma naquela manhã fresca. Após cerca de meia hora de voo, quando o avião já havia atingido a altitude de cruzeiro de 11 000 pés, a porta da cabine abriu-se e saiu o Mário João sorridente. Veio de propósito cumprimentar-nos. Levantámo-nos, abraçámo-nos e ficámos de pé a conversar. 

Contou-nos que não estava de serviço naquele dia, mas quando a Administração da Euro Atlantic soube na véspera que no voo estaria a delegação da Guiné-Bissau que vinha da mesa redonda, telefonaram-lhe a pedir que fosse ele a pilotar. Sentimos um orgulho indescritível.

Durante cerca de vinte minutos conversámos sobre o nosso país. Falámos da mesa redonda, da perspectiva de criação de uma companhia aérea nacional e da beleza das nossas ilhas. Disse-nos que em toda a sua carreira de piloto de longo curso, a ilha mais bonita que já sobrevoou é a de Caravela. Já no fim da conversa, confidenciou-nos que haveria uma surpresa no final do voo e fizemos uma fotografia juntos. A seguir regressou à cabine e voltou a assumir o comando do voo.

O aparelho deixou para trás a Península Ibérica e começou a sobrevoar o Magreb. Nós divertíamos com várias histórias engraçadas e bebíamos Moet & Chandon. O tempo passou e não demos conta. A dado momento, o avião começou a descer, avançando rapidamente em direcção ao solo. Mergulhou nas nuvens brancas e saiu pouco depois, deixando os passageiros com uma magnífica vista de rios a serpentearem por uma vasta planície verde. 

Num instante, aproximou-se da pista do Aeroporto Osvaldo Vieira, colocou-se a jeito e desceu ainda mais até sentirmos o seu impacto no solo. Olhei para o relógio. Eram 13h:05m. 

Enquanto o aparelho corria na pista, a janela da cabine abriu-se e uma enorme bandeira da Guiné-Bissau despontou do avião flutuando no ar. Olhei pela janela do lado esquerdo e vi uma imensa multidão à nossa espera. Baixei a cabeça e voltei a gritar:

– Uau.
Mário João despediu-se de nós à saída, desejando-nos boa sorte. Voltou a entrar na cabine para um breve descanso antes de voltar a descolar de volta rumo a Lisboa. 

Bissau, 12 de Março de 2016


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