sábado, 16 de janeiro de 2016

Rekado di ermondadi

“Na nha manera di odja”
Quando num tempo madrasta que já dura uma eternidade, em que se vilipendiam os valores da terra-Guiné, e se despreza o saber a honradez e verticalidade em favor de teorias inócuas de matchundadi revestida de ignorância, um grupo de homens e mulheres se reúnem para lá dos limites da cor política, com o fito de celebrar uma figura da envergadura de VASCO CABRAL, o Homem da Cultura, das letras e das ciências, é um sinal forte de que a alma guineense está viva e resiste  às investidas que visam desalicerçar a sua idiossincrasia – a nossa maneira de ser e de estar.
Ler Vasco Cabral, tê-lo em nós, é não perder a esperança. É conjugar o Homem na primeira, na segunda e terceira pessoa. O sujeito principal de toda a acção. É viver no presente o seu poema de 1957: “Disseram-me que parasse”. Um poema de esperança, de crença e de porfia pela vida. Um vida digna que nega a sujeição e o fatalismo dramático da incapacidade e do insucesso. Viajemos nalguns versos do poema:

Disseram-me que parasse, parasse
Porque o movimento cansa.
Eu não quis parar
E caminhei na estrada meus passos da esperança...
Disseram-me que chorasse, chorasse porque a vida é dor
E eu desatei a rir
Como Homem que endoidece
E cantei na estrada um canto libertador...
Disseram-me que fugisse, fugisse
Por querer a vida é tédio e a rosa se floresce também murcha quiseram vendar-me os olhos para que viesse, não viesse...
Mas nos pés tinha olhos...
e caminhei na estrada os meus passos de esperança até que esses olhos furaram a treva...

Não temos o direito de interpelar o passado com laivos de ressabiamento ou de doloroso ajuste de contas. A história ocupar-se-á dos registos e a todos julgará a seu tempo. E o tempo será o melhor fórum de justiça. O santuário para exorcizar os nossos fantasmas e os sacerdotes de tanta kabalindade que separa e divide os guineenses, afastando muitos para os caminhos da diáspora. E a  diáspora que mais dói é aquela que é vivida na própria terra, quando não se entra na engrenagem de uns ou de outros, gente que em boa verdade não tem projectos de progresso. Bandeiram a máxima de que “se não estás comigo é porque és contra”. Como dizia Amílcar Cabral, “gente que nunca fez nada.... gente que nunca valeu nada...” Do seu suor frio e calculista não caem gotas de kumpo terra.

NOTA do Editor: Excertos da carta “Rekado di ermondadiTony Tcheka, Lisboa, 18 de Agosto de 2011 
 
Fonte: Ordidja

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