Da Redação | 13/07/2017,
18h50 - ATUALIZADO EM 14/07/2017, 11h48
Nesta quinta-feira,
13 de julho, a 44ª Pauta Feminina, audiência pública mensal da Procuradoria
Especial da Mulher no Senado e parceiros, valorizou a voz e a imagem das
mulheres negras, em debate mediado pela deputada Luciana Santos (PCdoB-PE), uma
das quatro mulheres que presidem partidos políticos no Brasil.
Com o tema “Mulheres
Negras, trilhando caminhos para a igualdade”, a atividade aconteceu no “julho
das pretas”, mês em que se comemora no dia 25 tanto o Dia Internacional da
Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, estabelecido em 1992, e quanto o Dia
Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, definido pela Lei 12.987/2014,
iniciativa da senadora Serys Slhessarenko.
A cineasta Flora
Egécia abordou o papel do audiovisual como uma ferramenta de empoderamento das
mulheres negras. Diretora do filme Das Raízes às Pontas, ela falou
sobre a elaboração da obra, realizada a partir de convite da professora Débora
Tatiana de Morais, que abordava a relação das pessoas negras com seus cabelos
como forma de explorar possibilidades de aplicação da Lei
10.639/2003na rede pública do DF.
Acompanhada de
outras representantes do Coletivo de Mulheres com Deficiência do Distrito
Federal, Agna Alves falou sobre sua história. Nordestina, mãe solteira de dois
filhos, ela lidava com uma barraca de frutas na feira, antes de ficar
paraplégica, há três anos.
De acordo com seu
relato, foi numa conversa com seu filho, que lhe perguntou o que faria agora
que acumulava mais uma vulnerabilidade — negra, pobre, deficiente — que teve um
estalo:
— Eu preciso tomar
posse daquilo que eu sou, daquilo que eu tenho e daquilo que eu represento.
Empoderamento
Agna afirmou que as
mulheres têm que empoderar umas às outras, como ocorre no Coletivo das Mulheres
com Deficiência, criado há pouco mais de um ano, nascido de iniciativa de uma
mulher branca com deficiência intelectual.
Suplente mais votada
ao final da Conferência de Saúde da Mulher no DF, Agna lamentou que muitas
mulheres que têm plano privado de saúde e não são usuárias do Sistema Único de
Saúde (SUS) tenham brigado para ser as representantes titulares na etapa
Nacional da Conferência de Saúde das Mulheres, em detrimento de pessoas como
ela que precisam sair de Ceilândia de madrugada para chegar ao Plano Piloto.
Ester Monteiro,
diretora de Jornalismo da Secretaria de Comunicação Social do Senado (Secom),
superou a timidez — “fiz radiojornalismo para ficar escondida”, brincou — para
fazer um relato das raízes de sua família. Ester leu trechos do preâmbulo do
livro Minha Vida, meu Ministério, escrito por um tio-avô, Juracy
José Sias Monteiro, que ao morrer era o mais antigo pastor metodista do Brasil.
Bisneto de suíços, neto de espanhol casado com uma mineira de cor negra, Juracy
descreveu com grande argúcia o racismo brasileiro: "Parece-me que as
autoridades, tratando de documentos oficiais, por deferência, dizem que somos
de cor parda, mas o velho adágio diz que quem de branco escapa, de negro não
passa".
Ester Monteiro
narrou o início de sua trajetória em Brasília, durante a Constituinte de 1988,
quando acompanhou a então deputada Ana Maria Rattes. Num contexto de grande
efervescência política, ela se familiarizou com a luta política das mulheres e
dos negros por políticas afirmativas como vetores de construção de uma
sociedade mais justa.
Nascida
na Guiné Bissau, Eunice Borges, associada do Programa de Liderança e
Participação Política da ONU Mulheres no Brasil, resgatou os marcos
internacionais dos quais o Brasil é signatário como integrante das Nações
Unidas. Eunice partiu da Declaração e o Plano de Ação da Conferência de Durban,
na África do Sul — que considera “principal documento da sociedade civil no que
se refere à promoção da igualdade racial” — e chegou às metas do desenvolvimento
sustentável da Agenda 2030, passando pela definição da Década Internacional dos
Afrodescendentes (2015-2015).
Rainhas
Gerente de
Comunicação na Secretaria de Cultura do Distrito Federal, a jornalista e
dançarina Joceline Gomes leu o cordel escrito por Jarid Arraes dedicado a
Tereza de Benguela, rainha do quilombo localizado nas cercanias da primeira
capital do estado do Mato Grosso, Vila Bela da Santíssima Trindade, que durou
cerca de 25 anos, até ser destruído em 1770.
Uma das convidadas
para a Pauta Feminina, Jarid enfrenta problema de saúde que a impediu de
comparecer. Em seu cordel, ela destaca o desenvolvimento tecnológico e político
do quilombo, que contava com um parlamento e dominava a forja com a técnica e
fundição de metal, transformando correntes e armas em instrumentos de trabalho.
Joceline narrou os
desafios diários que enfrenta em função do racismo, com pessoas que “apontam”
para seu cabelo ou mesmo tocam sem sua permissão.
— Isso é uma herança
da escravidão: as pessoas acham que o seu corpo negro é um corpo público que
você pode tocar.
Para Joceline, o
movimento pela criminalização do funk pode ser comparado a atitudes semelhantes
já tomadas no passado em relação ao samba e a capoeira. E disse que, apesar da
lei 10.639/2003, ainda há forte reação dos profissionais da educação contrários
a trabalhar elementos da cultura da diáspora, como instrumentos de percussão.
Segundo ela, o
resultado dessa cultura escolar está manifesto no imenso estrago na
subjetividade de crianças negras, levadas a acreditar que descendem de escravos
e que “alienígenas” é que devem ter feito coisas como as pirâmides.
— Somos descendentes
de reis e rainhas. Somos descendentes de pessoas que descendem dos criadores da
civilização humana.
Exposição digital
Na abertura do
evento, houve lançamento oficial da exposição digital de fotografia Mulheres
Negras no Senado Federal, que reuniu fotógrafos voluntários e 35 mulheres
negras que trabalham no Senado. De acordo com relatório do Programa
Pró-Equidade de Gênero e Raça do Senado, entre as servidoras efetivas da Casa,
apenas 21% — uma em cinco — são negras, ao passo que as mulheres negras são 58%
das terceirizadas, 55% das estagiárias, 53% das jovens aprendizes e 33% das
comissionadas.
A exposição reúne
mulheres de todos os setores e ficará na rede intranet do Senado durante o
julho das pretas. Uma das mulheres negras fotografadas, Raimilda Bispo disse
que estava vivendo um "momento de rainha" durante a audiência
pública, mas que sua história no Senado “tem muito mais história de escrava”.
Segundo ela, no seu primeiro trabalho no Senado ela chegou a ouvir alguém
dizer: "Nossa, esta secretaria vai de mal a pior, tem até negra
trabalhando".
Semelhanças
Outra das mulheres
negras retratadas na exposição, a senadora Regina Sousa (PT-PI) ainda recolhia
a repercussão das ofensas que recebera em Plenário, feitas por um senador
incomodado com sua aparência e seu cabelo. Bisneta de escravos, Regina fez
breve intervenção na Pauta Feminina, deixando uma mensagem política:
— A gente precisa
encontrar nossas semelhanças para atuar juntas e não procurar nossas
diferenças.
Entre as cerca de 50
presentes, na sala 9 da Ala Alexandre Costa, estavam Rosimeri Mello Pereira, da
Subsecretaria de Políticas para as Mulheres do Distrito Federal; Tania
Fontenelle, cineasta; Flávia Fernandes, do Conselho Estadual da Mulher de Goiás
e da OAB-GO; Elce Guimarães, terapeuta; Lúcia Félix, consultora em Previdência
Social; Margarida Chaulet, da Frente Parlamentar Suprapartidária pelas Mulheres
na Política; Creuza Martins de Oliveira, da Federação Nacional das
Trabalhadoras Domésticas; e Gabriela Bastos, do Banco Mundial.
FONTE: Assessoria de
Imprensa da Procuradoria da Mulher do Senado
Agência Senado
(Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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